Julio
Mendonça
Participação
origina-se do latim “pars, partis”, que significa parte, quinhão, porção, o que
faz parte de. Daí deriva “participatio”: fazer parte, tomar parte. Portanto, na
participação fica implícita a noção de limitação: algo ou alguém (parte)
participa de alguma coisa que é maior ou mais complexa (todo). Essa dimensão
ampliada é, em muitos casos, também universal e envolvente. Ela nos remete à
dimensão da condição humana: cada ser humano lida com suas limitações e, ao
mesmo tempo, adquire uma maior ou menor noção da magnitude do conjunto das
realizações e das carências dos seus semelhantes, em relação às quais pode se
sentir menos ou mais responsável. Conforme sabemos, cada indivíduo faz parte de
uma determinada sociedade e da humanidade em geral, independente de sua
vontade. Ainda que sem sua consciência e à sua revelia, é chamado a fazer
parte, isto é, a tomar parte de alguns deveres e direitos. Imposições (ou
constrangimentos) e escolhas. Compromisso. Nossas limitações e carências nos
condicionam a nos submeter a compromissos. Nosso sentido de identificação e
pertencimento também pode nos motivar a, voluntariamente, assumi-los. Os termos
extremos dessa relação: por um lado, determinismo social, violência simbólica e
reprodução cultural; por outro, resistência política, cultural e ética. Em
algum ponto entre esses extremos, há a participação pelo convívio, pelo
compartilhamento: mais afetuosa, prazerosa e civil. Compromissos são assumidos, não com coisas,
mas com as relações. Por exemplo, relações de identidade e diversidade (as
quais se encontram na ordem do dia, no debate cultural atual). A participação
voluntária e consciente, decerto, requer conhecimento dos termos. Mas pode
implicar, também, a luta pela revisão e alteração desses termos. Em que termos
fazemos parte? Como lembra Boaventura de Souza Santos, o contrato social é a
metáfora que funda a modernidade e esse contrato “só se legitima pela não
existência de excluídos”, ainda que a inclusão generalizada seja mais formal do
que real. A modernidade – ressalta o autor – é um campo de lutas sobre os
termos da inclusão/exclusão. A participação, portanto – e desde que considerada
no seu espectro mais consequente, que transita entre responsabilização e
autonomia –, é fundamental para o alargamento dos limites da democracia e o
aprofundamento das suas consequências.
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