Relato de experiência levado ao Encontro da
Diversidade Cultural do ABC, realizado nos dias 21, 22 e 23 de novembro de 2013, no GT
"Formação, mapeamento e formulação de políticas culturais", por
Dalila Teles veras
Começo dizendo que, no campo
da cultura, nada acontece por acaso. Ao contrário da lógica dos resultados
imediatos da economia, neste nosso campo da cultura, tudo é resultante de um
processo. Assim, este nosso Encontro é fruto de vontades e ações, um processo
formado em décadas, finalmente amparado por duas respeitáveis instituições.
Eu diria que um dos possíveis
inícios desse acúmulo remonta ao GIPEM – Grupo Independente dos Pesquisadores
da Memória, que em 1990 chegou a reunir mais de 100 pesquisadores da memória
local e que exerceu, com eficiência,
pressões junto às Prefeituras dos 7 municípios, no sentido da
preservação da memória, responsável pela idealização do Congresso de História
do ABC. Este Congresso, além da
característica inusitada de reunir pesquisadores espontâneos e acadêmicos,
talvez seja o único caso conhecido no Brasil que se mantém há 23 anos de forma
ininterrupta, sendo que neste ano foi realizado pela 12ª vez.
Com o Fórum Permanente de
Debates de Debates Culturais não foi diferente. Uma série de episódios como as
discussões no Congresso de História do Grande ABC, realizado em São Bernardo do
Campo, em abril de 2007, que deixaram clara a insatisfação reinante da
comunidade cultural em relação a descontroles nas gestões municipais regionais,
reforçadas um pouco mais tarde nas discussões da Jornada ABCDMaior, igualmente
realizada em São Bernardo do Campo, levaram um grupo ligado à Livraria
Alpharrabio, que desde 1992 dedica-se ao debate de ideias, a se juntar a esses
outros cidadãos e, em 30 de novembro de 2007,
é fundado o Fórum Permanente de Debates Culturais do Grande ABC.
O Fórum, coletivo sem
configuração jurídica, nasceu com a proposta de criar um processo participativo
e crítico das políticas públicas da cultura e contribuir com a ação cultural
integrada na região do Grande ABC, sendo seu principal desafio contribuir para
mudar a concepção de fazer gestão pública de cultura.
A seguir, passo a enumerar
algumas das iniciativas do Fórum:
1) Convidados pelo Consórcio
Intermunicipal Grande ABC a integrar o Seminário Planejamento Estratégico
Regional em março de 2008, o Fórum contribuiu com acréscimos de novos programas
e sub-programas para os eixos estruturantes projetando a cultura como
centralidade e transversalidade no Planejamento Estratégico Regional 2010-2020.
O passo seguinte foi a criação do GT Cultura. Essa reunião histórica, reuniu pela primeira vez, no quarto ano das
respectivas gestões municipais, 6 das 7 Secretarias municipais de cultura, que
não se conheciam pessoalmente e jamais haviam antes esboçado quaisquer
discussão sobre problemas comuns na área da cultura. Pela primeira vez na
história do Consórcio, um GT contou com um representante da sociedade
civil na sua coordenação. Isso se deu não por força de lei, mas por um
princípio de reconhecimento, legitimidade e conveniência.
2) Constituído oficialmente,
o GT de Cultura, reunindo as 7 secretarias de cultura e representantes da
comunidade, encaminhou diversos projetos resultantes de demandas levantadas no
Fórum Permanente de Debates Culturais, dentre eles um Projeto de Censo Cultural
Regional, cuja proposta inovadora de
mapeamento sócio-cultural, seria o desdobramento em ações e contínuo
aperfeiçoamento das informações e referências;
3) O GT elaborou Mapa de
Equipamentos e Ações Públicas de Cultura no ABC, cujos questionários foram
remetidos às Secretaria de Cultura das 7 Cidades e devolvidos devidamente
preenchidos para análise.
4) Um programa de circulação
regional de produtos culturais foi sugerido e criado um subgrupo específico
para isso.
5) chegou-se a criar um
espaço no portal do Consórcio que, por um breve período, divulgou a Agenda
Cultural das 7 cidades.
6) Em 2009, agora sob
coordenação de Simone Zárate, membro do Fórum e
à época secretária de Cultura em Santo André, o Núcleo Estratégico (nova
nomenclatura do GT) realizou, a partir de uma demanda do Fórum, a Conferência Livre de Cultura 7 Cidades, da
qual participaram coordenadores de GTs e delegados eleitos nas conferências
municipais de cultura. Na ocasião foi vislumbrada, com o apoio declarado do
Minc, a criação de um Pontão de Cultura Mapeamento 7 Cidades através de convênio entre o
Consórcio Intermunicipal e o Ministério da Cultura que viabilizaria a
realização, entre outras ações, do Censo, mas que, por problemas burocráticos
não cumpridos pelo Consórcio não chegou a se efetivar.
Em 2010, com a mudança jurídica do Consórcio que passa a órgão público,
logradas todas as tentativas de continuidade, é vetada a participação social
nos GTs. Fomos barrados, mas ainda não
desistimos. É preciso pensar novas estratégias de participação social através
de instituições regionais.
7) Em 2010, o âmbito do debate do Fórum é ampliado para o espaço
virtual, com a criação do blog O lugar escrito, que divulga e armazena boa
parte desses debates, bem como artigos de seus membros e convidados.
8) Convidado a participar do 7º
Congresso dos Metalúrgicos do ABC em
nov. 2011 - o Fórum indicou 5 delegados, que apresentaram emendas relacionadas
com os temas da Relações Institucionais, Comunicação, Saúde no trabalho e meio
ambiente e Cultura.
9) 4 de seus membros,
participaram, com teses pessoais e como representantes do Fórum, do I Encontro
Paulista dos Pesquisadores da Cultura em 2012;
10) O Fórum tem patenteado
apoio incondicional à elaboração dos Planos Municipais de Cultura (Diadema, SBC
e SCS) bem como às Conferências Municipais de Cultura de outras cidades,
através da participação e troca de informações, bem como exercendo pressão
junto às administrações públicas.
11) Em seus permanentes
debates e palestras, o Fórum promoveu palestras com inúmeros intelectuais e
pensadores, intérpretes do ABC, recebeu representantes de Sindicatos,
estabeleceu diálogo e parcerias com Universidades, como a Universidade de São
Caetano do Sul e Universidade Metodistas, exibiu filmes sobre memória e
promoveu lançamentos de livros em suas reuniões mensais.
12) Em outubro de 2012, dois
de seus membros, foram convidados pela Reitoria de Pró-Extensão da Universidade
Federal do ABC a participar da Plenária do Plano de Desenvolvimento
Institucional - PDI - com a finalidade de discussão/formulação e planejamento
das diretrizes da Extensão. Na ocasião, entre outras ações, foi indicada a
realização de um Seminário de Cultura em parceria com aquela Instituição,
projeto que, após inúmeras reuniões e busca de outros parceiros, veio a se
transformar neste Encontro da Diversidade Cultural do ABC.
O Fórum possui um comitê
gestor, responsável pelo blog e questões práticas-administrativas, mas é aberto
a todos que desejem contribuir com o pensar cultural.
Movimento Cultura Viva Santo André
Em
fins de 2012, logo após a eleição da nova administração pública da cidade de
Santo André, intelectuais e produtores de diversas gerações da cidade passam a
se mobilizar no sentido de traçar estratégias para o estabelecimento de diálogo
na implantação das políticas públicas da
cultura do município. Assim, é criado em novembro de 2012, o Movimento Cultura Viva Santo André.
Diante
do anúncio do novo Secretário Municipal de Cultura, pessoa com evidente desconhecimento das especificidades
que envolvem as políticas públicas para a cultura e falta de familiaridade com
as questões que envolvem a produção cultural local, o Movimento Cultura Viva Santo André, elaborou
Manifesto público entregue no dia da posse do novo Prefeito, declarando essa insatisfação
e exigindo a implantação de uma gestão democrática, com mecanismos claros de
participação popular na construção de políticas e ações culturais, tanto quanto
na discussão sobre a composição do corpo diretivo da Secretaria de Cultura, sob
pena da cidade ficar refém de uma equipe nomeada pelo Secretário, com igual
dificuldade de entender as manifestações culturais e executar políticas
públicas da cultura condizentes com as demandas populares.
Os
primeiros encaminhamentos desse gestor
reforçaram o descompasso de suas ações que apontavam para uma continuidade de uma
política da cultura inconsistente, descomprometida e obsoleta, mero
entretenimento como a desenvolvida no município pela gestão anterior e o
ansiado diálogo não foi adiante, não passando de um desastroso primeiro
encontro com o novo secretário da cultura.
Nem
por isso Movimento Cultura Viva Santo André esmoreceu em seus propósitos e, com
o adesão de vários coletivos, como o Fórum Permanente de Debates Culturais e o
Sarau da Quebrada e outros, prosseguiu com ações organizadas, no sentido de fortalecer
a presença da sociedade civil na política cultural do município.
Dentre importantes ações, como debates abertos com temática diversas e aulas públicas, promoveu, em conjunto com os vários coletivos que o integram e apoiam, inclusive de outros municípios da região, a Conferência Livre de Cultura de Santo André, em junho de 2013, precedida de várias rodas de conversa preparatórias, com notórios especialistas em políticas públicas da cultura. O Ministério da Cultura acolheu o relatório com o farto material produzido e reconheceu oficialmente a Conferência Livre, convidando, às suas expensas, um representante para participar da III Conferência Nacional de Cultura a ser realizada nos próximos dias.
Dentre importantes ações, como debates abertos com temática diversas e aulas públicas, promoveu, em conjunto com os vários coletivos que o integram e apoiam, inclusive de outros municípios da região, a Conferência Livre de Cultura de Santo André, em junho de 2013, precedida de várias rodas de conversa preparatórias, com notórios especialistas em políticas públicas da cultura. O Ministério da Cultura acolheu o relatório com o farto material produzido e reconheceu oficialmente a Conferência Livre, convidando, às suas expensas, um representante para participar da III Conferência Nacional de Cultura a ser realizada nos próximos dias.
O
Movimento exerceu durante o decorrer deste ano, permanente ação fiscalizadora
diante das equivocadas e desastrosas ações da atual gestão em relação ao
patrimônio histórico da cidade, com pressão e intervenções decisivas. Apenas
para citar algumas dessas intervenções, a denúncia e posterior retirada de uma
pintura preta com que foram pintadas todas as obras públicas da cidade; A coleta
e encaminhamento de um abaixo-assinado com mais cerca de 1.500 assinatura
exigindo o retorno ao seu local de origem de uma escultura do artista Luiz
Sacilotto, retirada sem qualquer debate ou consulta prévia nem justificativa
plausível, que compõe todo um conjunto no centro da cidade, audiência pública com
o Prefeito e secretários sobre o Cine Teatro Carlos Gomes, denúncia sobre início
de reforma do Teatro Municipal de Santo André, sem que houvesse um projeto
adequado aprovado ou consulta aos órgãos competentes, pois trata-se de um bem
tombado.
Finalmente,
a contribuição decisiva a este Encontro da Diversidade Cultural do ABC
As
ações do Movimento Cultura Viva, via de regra, são registradas, além das redes
sociais (página no Facebook), no blog Movimento Cultura Viva Santo André e
muitas delas, transmitidas ao vivo pela Internet.
Se
o diálogo desejável não ocorreu, talvez a aposta pelo não diálogo tenha sido
tiro para fora da culatra, pois contribuiu
para uma maior união de forças coletivas e incentivo a permanecermos atentos. Cada
uma das novas ações simbolizam uma reserva moral de um manancial armazenado que
dá respostas e propõe. Não nos falta ousadia para escrever um novo roteiro para
as questões da cultura.
Não
há outro caminho senão o do fazer, o debater, o mobilizar, a pressão e a cobrança e é isso que
pretendemos continuar fazendo. No segundo momento deste GT podemos discutir os nossos
principais desafios e encaminhamentos.
Finalizo,
pedindo desculpas por falhas e omissões que, tenho certeza cometi, citando
Valter Hugo Mãe, escritor português da atualidade e da minha predileção:
"Somos o resultado de tanta gente, de tanta história, tão grandes sonhos
que vão passando de pessoa a pessoa, que nunca estaremos sós".
Salve a cultura plural e multifacetada na nossa Região! Salve a guerreira Dalila!
ResponderExcluir