Luiz Roberto Alves**
As universidades são tão importantes para a vida em sociedade que é possível compará-las a uma pequena escola rural/urbana de ensino básico. Por certo não são, numa visão estrutural, mais importantes do que a pequena escola, pois podem e devem, ambos os equipamentos culturais, construir saberes coerentes com seu meio social e seu destino. A postura radical pretende divergir, ao fim e ao cabo, de certo funcionalismo de pé-quebrado que confunde as grandezas e as substitui pela opulência, pelo investimento e pelo status social. De fato, os séculos 12 e 13 da Europa antes de construírem os edifícios depois denominados universidade, criaram uma linguagem distinta daquela que significava a igreja e o estado/governo. Mantido o respeito aos poderes derivados da fé tradicional e da ordem secular da sociedade, a nova linguagem pretendia universalizar o saber e a experiência das pessoas em afazeres distintos da tradição.
No interior do processo capitalista de autonomização da economia e de subordinação dos demais campos sociais, também a universidade abandona a memória física e simbólica da escola das crianças. Então aquele grupo de formandas/os pode dizer a Paulo Freire, em um de seus dias de paraninfo: “Professor, tomara que a gente não tenha de ir para escolas de favela. Nós temos medo dessas crianças e não sabemos trabalhar com elas”. O fenômeno pode levar a inúmeras exemplificações na sociedade brasileira. O processo de construção e veiculação do saber e do corpo individual e social que acumula o saber revela que isso ocorre quando não se encarna a experiência do conhecimento no local, no regional, condição para a universalidade. Simbolicamente, a universidade tanto constrói corpos autônomos e comprometidos quanto frankensteins, que não podem senão vagar em busca de morrer com seu criador.
O ABCD deseja, requer e precisa da universidade para dar novos saltos em seu desenvolvimento integral, sob o primado do bem público. As sinergias universidade/sociedade têm sido fogos-fátuos, passageiros. A UFABC, por exemplo, é pensada e vivida desde as sofridas reuniões em diretórios de estudantes nos anos 1970. No processo revitalizador capitaneado pelo Consórcio Intermunicipal pós 1990 criou ideias claras, massa crítica pública e enfim consecução no governo Lula. O que se exigia dela, no mínimo, era que houvesse contínuos canais de comunicação e efetivo engajamento na universalidade desta regionalidade. Uma universidade com a cara real desta região. Tomara ela esteja fazendo e venha a fazer até mais do que isso que se acalentou. Não como retórica, mas como processo de demonstração social conhecido e vivido. Ainda que os documentos político-pedagógicos de sua constituição,aqui escritos em 2004, tenham sido jogados em alguma lata de lixo, a consciência regional não exige menos. A universidade precisa ser tão cidadã quanto a pequena escola de crianças. Cidadã do lugar e do mundo.
* texto originalmente publicado no jornal ABCDMaior
** professor e pesquisador da Universidade Metodista e da USP.
** professor e pesquisador da Universidade Metodista e da USP.
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