terça-feira, 16 de agosto de 2011

Cidade em Transformação

Simone Massenzi Savordelli

Entendo que a cidade tem toda relação com a cultura, afinal são os hábitos, os costumes, o cotidiano das pessoas que determina qual o interesse delas pela cultura e pela exigência de melhores políticas públicas neste segmento.
Há dias venho observando, da minha janela, uma forte transformação da cidade e gostaria de compartilhar meus sentimentos.
Venho de uma origem de imigrantes italianos que foram os primeiros a formarem a cidade que, antigamente, era pautada por poucas pessoas que, num clima interiorano, se conheciam e compartilhavam suas vidas simples e de poucas ambições. Naquela época não tinha tanta necessidade de consumo, as crianças usavam calças curtas, vestidos rendados e os sapatos engraxados saiam do armário somente no domingo, para a missa. E, a missa era um evento muito esperado pois os jovens aproveitavam a oportunidade para flertar e para ir ao matinê que, diferente dos nossos dias, exibiam filmes em partes como se fossem séries e cada capítulo era ansiosamente aguardado pelos seus espectadores.
Ir para o centro de São Paulo exigia uma programação pois era um passeio mais complexo e em regra envolvia um transporte público escasso e compras de produtos que não existiam em nossa cidade.
Um simples sorvete e um refrigerante era uma bela diversão. A escola era um ponto de encontro e a televisão chegou somente para poucos e os vizinhos que não tinham condições de adquirir uma televisão acabavam por assistir, por vezes, das calçadas àquelas que estavam majestosas em algumas casas.
As crianças brincavam no rio que percorria (ainda percorre, mas não mais o vemos) a cidade e a alimentação era bem diferente. Minha avó comprava galinhas (vivas) e as engordava no quintal durante a semana para ser o almoço de domingo. A macarronada de quinta era esperada porque o trivial era arroz, feijão e um bife: produtos frescos adquiridos nas vendinhas dos bairros ... E assim este tempo foi passando e de ouvir estas histórias vividas pelos meus avós e pelos meus pais até sinto uma nostalgia e uma saudade de um tempo que não vivi.
Mas, me lembro perfeitamente da televisão colorida, que tinha um símbolo indicando esta alta-tecnologia; me lembro dos brinquedos “Estrela”; do meu primeiro vídeo game: o “Telejogo” que era feito de uma caixa de madeira, com tela branco e preto, com um controle composto de um “pininho” e os jogos (apenas quatro escolhidos em um botão redondo “seletor”) eram representados por jogadores “palitinhos” e bolinhas “quadradinhas”. Ah!!!... Disto sim, sinto saudades. Era um tempo tranquilo.
A cidade recebeu outros imigrantes e migrantes que mudaram os sotaques da cidade e os costumes das famílias que acabaram se formando de uma miscigenação própria de grandes centros e natural do mundo desenvolvido e globalizado. O clima interiorano não existe mais. Agregamos aos nossos hábitos uma alimentação industrializada e com origem em várias localidades do Brasil e do mundo.
A tecnologia dos produtos eletrônicos e o desenvolvimento da indústria e do comércio agregou a necessidade consumista e, hoje, da minha janela, vejo um vai-e-vem de pessoas frenéticas correndo contra o tempo, envoltas em suas tarefas diárias e ... comprando!
A diversão das crianças mudou, os jovens mudaram e os idosos também. Outro dia, assistindo ao telejornal, recebi um alerta: os netos precisam se adaptar a um novo perfil de avós! Os avós atuais são tão atuais quanto seus netos!!
Tudo está acontecendo muito rápido. Tenho a sensação de que o tempo do universo e da cidade em transformação está sendo mais ágil e mais rápido que o tempo que os nossos relógios são capazes de marcar. Estamos perdendo tempo, constantemente.
Na cidade tudo acontece ao mesmo tempo e me parece que isso tem total interferência na cultura pois nossos hábitos e costumes são questões culturais de base e determinam as exigências e necessidades da população.
De qualquer forma, desprendida das questões públicas de cultura e presa a uma nostalgia de um tempo antigo vejo da minha janela, apenas, que o mundo mudou, que a minha cidade mudou. Mudou bastante e rápido e, no meu entender, isso também merece atenção.
Hoje, as pessoas que aqui vivem talvez não olhem para o que um dia a cidade foi, não olhem para as pessoas que aqui um dia viveram e deram origem e oportunidade para a cidade ser o que é e se transformar em um futuro previsto e incerto.
Sinto saudades do meu próprio tempo ....

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